À Procura da Excelência: Modelos Personalizados para a Gestão de Riscos em Investimentos de Fundos de Pensão

Por: Sérgio Magalhães

Nos idos de 2010 a Previc adotou a metodologia de Supervisão Baseada em Risco, e desde então vem adequando sua sistemática para fiscalizar as fundações baseada na matriz de probabilidade e impacto da materialização dos riscos. Em resumo, quanto maior for a probabilidade de ocorrência e o impacto de determinado risco, maior será a fiscalização.

Desde que a Previc passou a enquadrar fundações sob a classificação de Entidades Sistemicamente Importantes (ESI), em 2018, ampliou a exigência para este grupo a exigência em relação à sistemática de fiscalização e gerenciamento de riscos.

O recado era claro: As provisões matemáticas, conjunto das obrigações atuariais dos planos em valor presente, que excederem 1% do total das provisões das EFPC exigiriam uma Supervisão Permanente, critérios diferenciados e estruturas mais definidas, segregadas e robustas em relação ao risco potencial da entidade, por isso a necessidade de uma estrutura adequada ao porte e complexidade da fundação.

A denominação ESI veio junto com uma glamourização desviada do seu real significado. Na minha visão, o “Somos ESI” nunca foi prêmio de reconhecimento, ou certificado de competência, e sim um indicador de risco, proporcional ao tamanho dos compromissos dos planos com o pagamento de benefícios atuais e futuros.

Diferentemente do ponto de vista dos mercados de dívida, financeiro e de capitais, não há quebradeira generalizada se um fundo de pensão falhar no seu compromisso de garantir o pagamento de suas obrigações, mas sim um prejuízo imenso aos participantes, sujeitos hipossuficientes da relação. 

Com a Resolução Previc nº 23/2023, a denominação “ESI” foi substituída por grupos de segmentação variando de S1 a S4, mediante critérios mais complexos de definição que levam em consideração uma série de fatores, desde o número de planos, exigível contingencial, quantidade de participantes, dentre outros.

Na minha visão, ponto para a Previc. A mudança foi benéfica pois conseguiu adequar os níveis de exigências às fundações em relação à supervisão, e estrutura da gestão de risco de maneira mais assertiva e personalizada.

 

Gestão de Riscos e os Investimentos

Um grande desafio para as entidades é definir seus modelos e estruturas de gerenciamento de riscos, sobretudo quando se exige segregação das atividades de gestão dos investimentos e gestão dos riscos relacionados.

A grande verdade é que não existe verdade absoluta, pelo menos quando se trata de gestão de riscos segregada da gestão de ativos. Tive oportunidade de conversar com diversos representantes de fundações, consultores, gestores e distribuidores de valores mobiliários, e fica evidente que cada fundação segue sua forma. A grande pergunta que permeia o sistema é: será que meu formato atende às exigências de fiscalização? 

Enquanto isso, a pergunta mais adequada deveria ser: o meu formato ajuda a entidade a gerenciar os riscos dos investimentos de maneira independente reduzindo um potencial conflito de interesses inerentes às atividades de gestão de ativos e de riscos?

Por sorte, há amplo espaço para desenvolvimento de modelos que atendam plenamente às exigências regulatórias e ainda viabilizem a gestão dos investimentos.

Em primeira instância é necessário mapear as atividades, processos e alçadas que precisam prioritariamente ser segregadas e principalmente ter em mente, que a atividade de gestão de investimentos é inerentemente, essencialmente e intrinsecamente relacionada à gestão dos seus respectivos riscos, e por mais que haja uma segregação de departamentos com divisão de tarefas e atividades, o gestor de investimentos deverá SEMPRE estar avaliando os sua carteira e decidindo sobre os riscos, seja para aceitá-los, seja para rejeitá-los.

Existe uma célebre passagem do ex-secretário de defesa Americano, Donald Rumsfeld, onde coloca de maneira brilhante que boa parte dos riscos estão concentrados naquilo que não sabemos que não sabemos, os uknowns unknowns. 

 

“Existem coisas que sabemos que sabemos. Sabemos também que há coisas que sabemos que não sabemos. Mas há também desconhecidos, desconhecidos – as coisas que não sabemos que não sabemos.”

Donald Rumsfeld, Secretário de Defesa dos Estados Unidos, 2002.

 

Por isso recomendo que as entidades estudem os modelos para que se desenhe o seu próprio mecanismo de gerenciamento, adequado à sua realidade específica e não ao modelo adotado por outra Entidade, pois certamente, este pode funcionar perfeitamente, porém atende à uma realidade específica que não necessariamente à sua fundação.

Diante do impasse, vejo o Modelo de Três Linhas desenvolvido pelo IAA (The Institute of Internal Auditors) como uma solução interessante. Vejamos que a primeira linha deve ser a própria área originadora do risco, que identifica, avalia, mensura e toma ações mitiagoras, tomando propriedade por conhecer melhor do que nenhuma outra área os riscos inerentes aos seus processos e atividades; na segunda linha está uma área de gestão de riscos mais independente, fornecendo assistência no gerenciamento dos riscos, podendo realizar testes, análises de conformidades, recomendando modificações de rota, demandando esclarecimentos e reportando suas impressões à Governança; enquanto que na terceira linha, estão o Conselho Fiscal, Comitê de Auditoria, Auditoria Interna e Outros. 

Simultaneamente, um outro modelo que se adequa perfeitamente a realidade da gestão de riscos de investimentos é a Gestão de Riscos Baseada em Cenários, pois envolve a criação sistemática de cenários hipotéticos para identificação e avaliação de riscos potenciais e cenários que a fundação pode enfrentar ou se beneficiar, permitindo que se preparem para uma gama de possíveis desdobramentos, e desenvolvendo estratégias prévias de mitigação e planos de contingência. Esta abordagem é excelente para responder e preparar gestores e fundações para cenários como: “Se amanhã a taxa básica de juros cair para 2% ao ano, qual o impacto nos títulos públicos? E na renda variável? Qual a movimentação e alocação ideal nesse cenário?” 

Planejar o que fazer diante de mudanças certamente é melhor do que agir no calor da emoção, pois seguir o plano é a melhor estratégia para dissociar os efeitos psicológicos e pressões externas e internas para decisões improvisadas.

Importante ainda que o gestor de ativos, e o gestor de riscos de investimentos conheça profundamente a matriz de riscos da sua fundação, pois é o modelo de supervisão utilizado pela Previc. Nada melhor do que entender o que o órgão fiscalizador pensa em relação ao gerenciamento dos riscos de liquidez, crédito e solvência, por exemplo. Então, sugiro a leitura atenta aos relatórios de estabilidade do sistema, e seus informes estatísticos trimestrais, bem como seus indicadores e formatos de avaliação.

Mais do que definir um modelo, é fundamental que a governança calibre bem os níveis de atuação em relação à autonomia, alçadas, capacitação, especialização das equipes e independência da gestão dos riscos, para que evitar dois extremos indesejados:

  1. A gestão de riscos que tudo aceita, mera carimbadora das decisões da gestão de ativos. e
  2. O engessamento da gestão, inviabilizando decisões relacionadas à tomada de riscos que estão adequados aos níveis esperados.

 

Nos investimentos, assim como na vida, não há retorno sem risco, o duro é descobrir quais são os riscos certos. 



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